Teu cheiro amarfanho durante toda a cidade
e nos dentes postos sobre a mesa
como um escapulário tua lascívia eu pressinto.
Nem a lua nem teus olhos certamente me salvarão deste teu cheiro espesso.
Eu cresci nestas estranhas paragens sem estrelas entre bichos e flores
como se não fossem cobertos pela escuridão.
Apenas arfava um golpe entre o vazio de mim
e a captura de insetos do inferno em teus cabelos.
Em inquietude, me preparo para a dor.

Nelson Magalhães Filho


"Não sou nada.
Nunca serei nada.
Não posso querer ser nada.
À parte isso, tenho em mim todos os sonhos

do mundo."
( Fernando Pessoa: Tabacaria)




Realizar trabalhos de arte a base das experiências existenciais, como transpor as imensidões dolorosas das noites urinadas. Fingir figuras concebidas do desejo e da amargura. Instigações obscurecidas pela lua. Não acretido na pintura agradável. Há algum tempo meu trabalho é como um lugar em que não se pode viver. Uma pintura inóspita e ao mesmo tempo infectada de frinchas para deixar passar as forças e os ratos. Cada vez mais ermo, vou minando a mesma terra carregada de rastros e indícios ásperos dentro de mim, para que as imagens sejam vislumbradas não apenas como um invólucro remoto de tristezas, mas também como excrementos de nosso tempo. Voltar a ser criança ou para um hospital psiquiátrico, tanto faz se meu estômago dói. Ainda não matem os porcos. A pintura precisa estar escarpada no ponto mais afastado desse curral sinistro.
Nelson Magalhães Filho

sexta-feira, fevereiro 27, 2009

Nelson Magalhães Filho. ANJOS BALDIOS 2009, acrílica s/tela, 100X80 cm

hoje a lua vaga puta exacerbada
sangrando seiva amarela
como um triste anjo-girassol

perdido do amor insano dos anjos.
hoje beijo teu rosto uma rosa negra
beijo tua boca uma rosa negra revestida
pelas marés incertas de lágrimas ensandecidas
deixando marcas de um amor sem cura
o mesmo beijo encarniçando

aquela aflição sem limites
a tristeza cruenta dos anjos.

Nelson Magalhães Filho

10 comentários:

Lupeu Lacerda disse...

e quem mais teria autoridade de falar da tristeza "cruenta" dos anjos, do que um anjo baldio?
fuderoso como sempre ser de asas.

hasta siempre.
as telas? pooooooorrraaaaaa!!!!

Ricardo Thadeu (Gago) disse...

tive uma imagem mental: um anjo-girassol olhando prum lado e pra outro, procurando o amor perdido.aflito.

de primeira, nelson.
adiós.

sheyla de castilho disse...

palavras que se transfiguram em imagens nada baldias... muito bom!

Ateliê Da Lagartixa disse...

Sou sua fã!!! a nº01 já ta muito manjada...posso ser qualquer nº, mas de uma coisa tenha certeza, adoro seus trabalhos!!!sucesso.
bjs de lagartixa!

Anônimo disse...

Porra Nelson...teu blog é do caralho. Os textos são foda e as telas mais ainda.
Valeu pela visita ao meu bloguinho tosco.
Vou te adicionar à lista de favoritos ok?
Apareça sempre. É uma honra.
Abraço

bat_thrash disse...

Bom demais!

Beijos.

Zinaldo Velame disse...

"Anjo-girassol", de arrombar Magalhães, Belo poema! Abraço.

Adriana Godoy disse...

Que crueza, que beleza, que poema! Bj

TICTAC disse...

um anjo-baldio que tem um mundo interior cheio de emoções..

belos textos e belas telas.

um abraço

Zana Sampaio disse...

sensibidade da mais alta peversidade!
muito bom mesmo!