Teu cheiro amarfanho durante toda a cidade
e nos dentes postos sobre a mesa
como um escapulário tua lascívia eu pressinto.
Nem a lua nem teus olhos certamente me salvarão deste teu cheiro espesso.
Eu cresci nestas estranhas paragens sem estrelas entre bichos e flores
como se não fossem cobertos pela escuridão.
Apenas arfava um golpe entre o vazio de mim
e a captura de insetos do inferno em teus cabelos.
Em inquietude, me preparo para a dor.

Nelson Magalhães Filho


"Não sou nada.
Nunca serei nada.
Não posso querer ser nada.
À parte isso, tenho em mim todos os sonhos

do mundo."
( Fernando Pessoa: Tabacaria)




Realizar trabalhos de arte a base das experiências existenciais, como transpor as imensidões dolorosas das noites urinadas. Fingir figuras concebidas do desejo e da amargura. Instigações obscurecidas pela lua. Não acretido na pintura agradável. Há algum tempo meu trabalho é como um lugar em que não se pode viver. Uma pintura inóspita e ao mesmo tempo infectada de frinchas para deixar passar as forças e os ratos. Cada vez mais ermo, vou minando a mesma terra carregada de rastros e indícios ásperos dentro de mim, para que as imagens sejam vislumbradas não apenas como um invólucro remoto de tristezas, mas também como excrementos de nosso tempo. Voltar a ser criança ou para um hospital psiquiátrico, tanto faz se meu estômago dói. Ainda não matem os porcos. A pintura precisa estar escarpada no ponto mais afastado desse curral sinistro.
Nelson Magalhães Filho

sexta-feira, abril 17, 2009

CY TWOMBLY VERSUS OS CONCEITOS PÓS MODERNOSOS


Miguel Cordeiro. Compart - 2008

Cy Twombly é um artista plástico (pintor e escultor) que figura entre os mais conceituados da contemporaneidade e um dos meus favoritos. Nascido em 1928 e americano de nascimento, porém radicado na Itália há décadas, seu trabalho é calcado no abstracionismo e caracteriza-se pela informalidade. Espécie de precursor dos artistas grafiteiros, Twombly expressa em suas obras de cunho minimalista um despojamento que assusta aqueles que acham que arte deve ser algo rebuscado. - ah, qualquer criança faz isso; - assim os desavisados costumam reagir frente aos seus trabalhos. E é claro que não é por aí, mas entende-se tal reação. É sempre mais fácil complicar e querer demonstrar habilidade acadêmica, e a arte produzida a partir da segunda metade do século 20 será sempre um enigma para aqueles que não compreendem sua abrangência. Mas de uma década para cá, e em especial aqui no Brasil, a mídia especializada fez a opção em dar destaque a uma arte que mergulhou numa viagem de hermetismo (sem lirismo ou humor), onde se destaca as abordagens que visam o simulacro, a metáfora. Uma espécie de arte duchampiana desprovida do sentido anárquico da personalidade de Marcel Duchamp. Assim vivemos esta fase em que se prolifera uma criação artística que se autodefine liberta de amarras, mas que na verdade é impregnada de conceitos estéticos acadêmicos e elitistas; mesmo que na maioria das vezes o artista em questão mal sabe desenhar uma maçã. E virou rotina nas galerias e nestes badalados salões de arte o exemplo de artista que espalha vinte cadeiras vazias frente a vinte mesas dispostas em forma circular, e em cada destas mesas repousa um computador com seu respectivo monitor e HD. E o criador tem todo um arcabouço teórico para explicar sua obra, e certamente dirá que se trata de um simulacro, uma metáfora que evoca uma lan house deserta pelo vazio existencial das relações virtuais. Uáááu, que bela definição! E a crítica acha original, genial e maravilhoso. Pura falta de informação, visto que Duchamp fez tudo isto há cem anos atrás e de forma mais criativa ao transformar objetos do cotidiano em arte. E com humor, afinal sem ironia a arte simplesmente não vibra. Engraçado é que esta tendência de arte conceitual, séria e complicada tem uma grande aceitação nas ditas vanguardas artísticas de países economicamente atrasados. E tal tipo de academicismo às avessas é algo que permanece nestes ambientes, e o Brasil é parte disto. Por aqui ainda se fala em Semana de 22, Tarsila do Amaral, Portinari e Di Cavalcanti como símbolos da modernidade artística nacional. E, no entanto, coisas interessantes e instigantes estão em todo lugar. Mas voltando a Cy Twombly, convém afirmar que sua produção aparentemente simplória está anos luz à frente destas obras de arte “cabeça” de conceitos pós modernosos.

Miguel Cordeiro

http://www.miguelcordeiroarquivos.blogger.com.br/

Veja mais sobre Cy Twombly:

http://www.leninimports.com/cy_twombly.html#part2

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