Teu cheiro amarfanho durante toda a cidade
e nos dentes postos sobre a mesa
como um escapulário tua lascívia eu pressinto.
Nem a lua nem teus olhos certamente me salvarão deste teu cheiro espesso.
Eu cresci nestas estranhas paragens sem estrelas entre bichos e flores
como se não fossem cobertos pela escuridão.
Apenas arfava um golpe entre o vazio de mim
e a captura de insetos do inferno em teus cabelos.
Em inquietude, me preparo para a dor.

Nelson Magalhães Filho


"Não sou nada.
Nunca serei nada.
Não posso querer ser nada.
À parte isso, tenho em mim todos os sonhos

do mundo."
( Fernando Pessoa: Tabacaria)




Realizar trabalhos de arte a base das experiências existenciais, como transpor as imensidões dolorosas das noites urinadas. Fingir figuras concebidas do desejo e da amargura. Instigações obscurecidas pela lua. Não acretido na pintura agradável. Há algum tempo meu trabalho é como um lugar em que não se pode viver. Uma pintura inóspita e ao mesmo tempo infectada de frinchas para deixar passar as forças e os ratos. Cada vez mais ermo, vou minando a mesma terra carregada de rastros e indícios ásperos dentro de mim, para que as imagens sejam vislumbradas não apenas como um invólucro remoto de tristezas, mas também como excrementos de nosso tempo. Voltar a ser criança ou para um hospital psiquiátrico, tanto faz se meu estômago dói. Ainda não matem os porcos. A pintura precisa estar escarpada no ponto mais afastado desse curral sinistro.
Nelson Magalhães Filho

quinta-feira, agosto 06, 2009

Nelson Magalhães Filho. ANJOS BALDIOS 2009. Acrílica s/tela, 80X70 cm

Neste tempo da frieza comeremos arenques defumados
enquanto viajamos nas emporcalhadas vagas boreais
profanando as lembranças azedas dos santos
que nos benziam ao fim de cada noite com sua flor
arroxeada chispando no céu.

Nelson Magalhães Filho

6 comentários:

Luciano Fraga disse...

Buenas, "neste tempo de frieza", não comeremos só arenques, também o pão que o diabo amassou, em noites de sexta feira santa.Crispante, forte abraço.

O Neto do Herculano disse...

Saudações literárias!

karina rabinovitz disse...

gostei do texto. forte!

mas espero pelo sol, pra aliviar essa frieza...

Non je ne regrette rien: Ediney Santana disse...

-com sua flor
arroxeada chispando no céu-
bela imagem para uma flor gostosa, espero

Ruela disse...

Do melhor!

Abraço.

Adriana Godoy disse...

Duca!! Saudade de vir aqui, mas vim hoje e gostei de novo e mais. beijo